Como resposta aos desastres naturais, crises sanitárias e conflitos armados que tão frequentemente abalam as nossas sociedades, arquitetos precisam agir rapidamente, usando a sua criatividade para apresentar soluções emergenciais aos mais urgentes problemas de nosso tempo. À seguir, compilamos uma lista de projetos inspiradores que exploram uma faceta da arquitetura que nem sempre está destinada às primeiras páginas das revistas, mas que neste momento, parecem ser a única arquitetura possível, estruturas honestas que procuram solucionar problemas, unir pessoas e resgatar comunidades.
A arquitetura de emergência é uma tipologia que se desdobra das mais variadas formas, assim como serve para atender uma enorme diversidade de circunstâncias excepcionais – sendo a última delas uma crise sanitária mundial. Neste contexto, soluções emergenciais passaram da noite para o dia a ser o centro das atenções, algo que nos faz refletir sobre a importância deste tipo de estruturas, que até ontem, permaneciam à sombra de outros discursos e tendências, mas que em outros contextos – menos privilegiados – tem sido da maior importância já a algum tempo. Tudo aquilo que para nós parece tão cotidiano e as vezes até vulgar, em outros contextos pode ser algo inalcançável, que apesar de ser uma necessidade básica, ainda assim, encontra-se tão distante daquela realidade.
É mais do que evidente a importância de espaços pedagógicos e culturais para uma sociedade, entretanto, muitas vezes esbarramos em uma série de dificuldades de ordem financeira e burocrática quando projetamos edifícios educacionais. Em contextos mais frágeis – comunidades carentes e países que enfrentam dificuldades como guerras e epidemias com frequência –, a relevância destes espaços pode ser ainda mais determinante para a vida destas pessoas. Os projetos que serão apresentados à seguir, foram escolhidos por serem ótimos exemplos para ilustrar o que estamos falando, situações onde arquitetos exprimem toda a sua criatividade para fornecer soluções responsivas capazes de aproximar pessoas e unir comunidades através da educação.
Escola Primária Comunitária para Meninas / Orkidstudio
O surto de Ebola na África Ocidental foi relatado pela primeira vez em março de 2014 e rapidamente se tornou a ocorrência mais mortal do vírus desde sua descoberta em 1976. Como a região já atravessava um período de enormes desafios econômicos e sociais, especialmente a Serra Leoa – que se recuperava de mais de uma década de guerra civil –, a epidemia Ebola foi um duro golpe em seu processo de desenvolvimento e crescimento. Foi neste contexto que, os arquitetos do Orkidstudio desenvolveram o projeto para a Escola Primária Comunitária para Meninas em Kenema, oferecendo esperança e inspiração a um notável grupo de jovens mulheres. A estrutura da escola também serve à toda a comunidade de modo geral, abrindo suas portas a muitos estudantes jovens animados, oferecendo novos empregos para a comunidade local, tornando-se um símbolo da resiliência deste povo. O impacto da epidemia de ebola no contexto social e econômico do país, fez com que os arquitetos refletissem, desenvolvendo soluções criativas capazes de reconstruir uma comunidade maltratada pelas agruras da guerra e pelas aflições das recentes crises econômicas e sanitárias que assolaram o país.
Colégio InsideOut / Andrea Tabocchini & Francesca Vittorini
Quando o vento destruiu a única escola desta remota aldeia rural no interior profundo de Gana, os arquitetos italianos Andrea Tabocchini e Francesca Vittorini – contratados por uma iniciativa sem fins lucrativos – deram início ao processo de projeto de um protótipo de escola que pouco tempo depois receberia vários prêmios internacionais de arquitetura. O edifício, construído com apoio de voluntários de vinte países diferentes e com o engajamento da população local, foi erguido em tempo recorde, em apenas 60 dias e com um custo estimado de somente 12 mil euros.O projeto faz amplo uso de materiais locais e devido a falta de recursos e as limitações do terreno, converteu-se em uma oportunidade para propor um desenho sustentável que mistura arquitetura e paisagem. Desastres naturais muitas vezes deixam um rastro de destruição fazendo com que cidades e vilas inteiras tenham que ser reconstruídas. A proposta nasce do questionamento de como projetar soluções que permitam criar espaços flexíveis capazes de responder as incertezas do futuro.
Escola Primária em Gando / Kéré Architecture
A Escola Primária projetada pela Kéré Architecture em Gando, Burkina Faso, surge como uma resposta à carência de estruturas educativas – sobretudo infantil – no país. Com o apoio da comunidade local e com recursos captados através da sua fundação ‘Schulbausteine fuer Gando’ (ou Tijolos para Gando em alemão), o arquiteto burquinense Francis Kéré deu início aquele que seria o seu primeiro projeto construído: a Escola Primária de Gando. O edifício da escola foi concebido para ser construído pelos próprios moradores do pequeno vilarejo burquinense, utilizando materiais e técnicas construtivas locais. Através do engajamento da comunidade, a nova Escola de Gando representa um importante marco para a pequena vila que viu nascer seu mais célebre filho: Francis Kéré. A escola é um exemplo de como a utilização de materiais e técnicas locais pode ser capaz de unir e aproximar pessoas. Além da construção, a manutenção do edifício é feita pelos próprios moradores, permitindo que o edifício perdure ao longo do tempo.
Escola Inicial e Primária Unión Alto Sanibeni / Semillas
Durante o conflito armado peruano entre 1980 e 2000, o qual ficou conhecido como “a época do terrorismo,” a comunidade nativa Ashaninka que habita a floresta amazônica peruana, foi uma das comunidades mais afetadas, sofrendo sérias consequências e passando por um longo período de abandono a partir dos anos 2000. Após oito anos de exílio forçado, a comunidade finalmente recuperou seu direito e voltou ao interior da floresta de onde havia sido expulsa. A proposta da Escola Unión Alto Sanibeni, projetada pelos arquitetos do Semillas, não apenas cumpre com o seu papel educacional, acolhendo mais de 200 crianças da comunidade, mas também opera como o principal centro social de toda a população Ashaninka da região.
Todos nós estamos nos questionando em como o atual surto de COVID-19 irá transformar a maneira como gerimos, ocupamos e projetamos nossos espaços educacionais. Neste contexto, estes projetos inspiradores, foram aqui compilados para ilustrar como a arquitetura é capaz de reconstruir comunidades e apresentar soluções aos problemas mais urgentes de nosso tempo.